Com muitos problemas de tom em sua narrativa, Eu me Importo conseguiu errar em - quase - todos os pontos. (SPOILERS LEVES)
Ao assistir o trailer, vemos a promessa de um filme de humor cínico com belas cenas e uma trama bem interessante, enquanto acompanhamos - e torcemos por - uma protagonista de caráter questionável. E isso é o que vemos por alguns minutos antes de um outro filme começar na sua frente.
O filme começa de maneira excelente e mostra, logo de cara, o tipo de protagonista que veremos em Marla Grayson (Rosamund Pike). Uma personagem determinada, inescrupulosa e carismática, que não deita pra ninguém. O tipo de papel que Pike nasceu para fazer, como foi visto de maneira espetacular em Garota Exemplar. O primeiro ato do filme cativa com a apresentação de um esquema verdadeiramente cruel e inteligente que Grayson gerencia, ao mesmo tempo que dá pistas de que há mais do que o olho pode ver com aquela personagem.
Com um início genial, fica difícil não gostar da personagem que seria desenvolvida dali pra frente, dá vontade de torcer por ela. Você quer gostar dela. Todavia, existe uma queda de braço dentro da direção narrativa escolhida, porque de um lado vemos aquele humor seco e irônico da protagonista, e de outro está uma trama obscura ligada à máfia russa. É aqui que a visão que J Blakeson (A 5ª Onda, Abismo do Medo 2), diretor e roteirista, falha. Eu me Importo é classificado oficialmente como uma produção de comédia, crime e thriller, nesta ordem. Todos esses gêneros estão no filme, mas em cada momento em que um se sobressai Blakeson não consegue equilibrar bem e o efeito que se esperava causar não é alcançado.
Apesar de diálogos espertinhos, o filme falha em realmente entregar o humor prometido. Na realidade, ele falha em entregar qualquer tipo de humor. Ainda mais depois da apresentação do personagem de Peter Dinklage (Game of Thrones, Pixels) que praticamente transforma o filme inteiro em uma história de crime e mistério, com toques de crueldade que respingam até mesmo nas ações da protagonista. Mas essa mudança em tom não seria um problema se feito da maneira correta. Em 2019 vimos Parasita fazer isso de maneira espetacular e levar vários Oscars. O problema aqui é não conseguir se segurar com uma identidade apenas, pois meio a essa nova narrativa, nós vemos a tentativa absurda de encaixar um humor caricato no meio. Com direito ao uso de dardo tranquilizante e cilindro de oxigênio voando como foguete.
A direção técnica acaba minando outras áreas bem sucedidas da produção. Um exemplo é a direção de arte e fotografia da Black Bear Pictures (Vigiados, O Retorno de Ben), que emula bem o tom flutuante do filme e consegue pôr em tela um belo trabalho com o uso de cores vibrantes e trabalho de câmera minucioso. É muito bonito ver o uso de iluminação neon para dar o tom das cenas, principalmente quando é aliado a planos tão bem executados.
Falando em acerto, o maior desse filme é a escalação do elenco. Todos
atuam excelentemente, às vezes bem até demais, como é o caso de
Dianne Wiest (Lista Negra,
Edward Mãos deTesoura), que entrega uma interpretação digna de seus dois Oscars, mas que
simplesmente não encaixa neste filme; e Rosamund Pike que dá um show e
consegue segurar o espectador na cadeira até o final.
Em conclusão, Eu me Importo é uma salada caótica de gêneros com uma protagonista cativante e belos visuais, que tinha tudo para funcionar em sua narrativa inicial de sátira ao capitalismo, mas por falta de foco narrativo acabou se perdendo. Resumindo: máfia russa encontra gays trambiqueiras em um asilo de idosos. Vale a pena assistir sem muita expectativa, mas sabendo que poderia ter sido muito mais.
Nota: 6,0/10
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